Transcrição do áudio:

 

Bom, meu nome é Almeida, tenho 22 anos e sou do campus Osasco.

Nesse áudio eu vou contar um pouquinho da minha vida até aqui, dos meus 22 anos e de como eu vim parar aqui na Unifesp.

Eu nasci na Bahia, numa cidade que chama Monte Santo, né, no estado da Bahia. É uma cidade que tem um pouco mais de 50 mil habitantes, pequena e uma família muito humilde… ah… minha família não morava na cidade, a gente morava em um lugar que se chama Povoado, que é como se fosse o interior da cidade. Ah, minha mãe conheceu o meu pai quando ela tinha 14 anos e aos 17 ela ficou grávida e foi quando eles se separaram. Eu nasci… é… e não conheci meu pai… minha mãe muito nova e por a gente em uma cidade muito pequena, onde tem muitos costumes e tradições, ela teve que vir pra São Paulo trabalhar e eu fiquei morando com meus avós maternos que… eu morei até os meus 12 anos de idade e que eu chamo eles de pai e mãe que foram realmente o meu pai e minha mãe, foram eles. Não conhecia o meu pai até os meus 12 anos e durante toda a minha infância eu cresci sentindo a falta do meu pai… é… na escola e em diversos momentos que… eu acho que é fundamental o papel do pai… por mais que eu tenha o meu avô que fazia esse papel, mas sempre tive a curiosidade e aquele desejo de conhecer meu pai. Ao mesmo tempo que eu não queria, eu queria muito… é… tentava me enganar falando que não queria conhecer ele e senti muita falta da presença do meu pai e também da minha mãe porque infelizmente eu tive que ficar sem os dois… é… falava com a minha mãe algumas vezes por telefone… que eu me lembre foi poucas porque era muito difícil contato naquela época, porque como falei minha família era muito humilde e a gente não tinha telefone fixo e lá não tem sinal de celular até hoje. Cresci e conheci meu pai com 11 anos… eu tava na 5ª série, que hoje é o sexto ano, né. Foi quando eu conheci ele. Ele morava aqui em São Paulo e voltou pra lá, pra cidade de onde nasceu… onde eu cresci… pra tentar a vida lá e foi quando eu conheci ele. Quando eu tinha acho que 13 anos eu resolvi vim pra São Paulo porque… morar com minha mãe, porque eu sempre tive vontade de fazer uma graduação e que não tem na cidade que eu moro, não tinha… ainda não tem, na verdade… é… a graduação que eu queria fazer que era engenharia de mecatrônica… é… eu conheci esse curso lendo um livro quando eu tinha uns 11 anos e eu me encantei pelo curso e sempre tive esse desejo de fazer esse curso, porém, na cidade que eu morava não tem… é… não tem esse curso, essa graduação e como eu sabia que São Paulo tinha, eu optei por vir morar com minha mãe, mesmo sabendo que não seria a melhor escolha devido ao apego que eu tenho dos meus avós, que me criaram. Eu resolvi vir pra São Paulo, minha mãe foi passear, ver os pais dela e eu voltei com ela pra São Paulo, com 13 anos… é… eu tava na 8ª série… é… estudei numa escola do estado onde eu sofria bullying por ser da Bahia, por ter outro sotaque. Foi muito difícil o primeiro ano. Eu estudei nessa escola por 2 anos, a 8ª série e o primeiro ano do ensino médio. E, no segundo ano, eu sempre quis mudar de escola, mas… é… como a gente morava numa área periférica, a maioria das escolas eram daquele jeito e… até que no segundo ano do ensino médio, a minha mãe conseguiu me transferir pra outra escola na região central, onde eu já me sentia melhor. 

É… fiz o segundo ano nessa escola, chamava Antunes. É… eu morava em Santo André na época e no fim do segundo ano quando terminou o ano letivo eu fui passear, eu fui pra Bahia com… com minha mãe, com meu padrasto e os meus irmãos… é… visitar os meus avós e eu resolvi que eu queria ficar lá… é… não senti vontade de voltar. E aí eu terminei, eu fiz o terceiro ano do ensino médio em uma escola do estado também, lá… lá na Bahia. Então, tipo, o meu ensino foi bem defasado já por estudar numa escola… em escola pública e desde criança, tipo, o ensino é bem diferente onde eu morava, por ser uma cidade pequena… na verdade eu estudava até a 4ª série, eu estudei no Povoado, que é a escola em que tinha lá, onde eu morava. Que, tipo, é a mesma professora… é… desde a 1ª série até a 4ª. E aí eu terminei o 3º ano do ensino médio lá, na Bahia, nessa cidade que chama Monte Santo. E ai eu fiquei um ano lá… é… tentando trabalhar, só que como a cidade é muito pequena… é… não conseguia um emprego e também queria… sempre tive a vontade de voltar pra São Paulo pra fazer a graduação. 

Como eu fiz o Enem e minha nota não foi tão boa é… no ano de 2013, que foi quando eu terminei o ensino médio, eu optei por ficar lá mais um ano estudando e tentar… eu fiz o Enem… tentar fazer o Enem de novo pra… vim pra São Paulo tentar conseguir uma bolsa e, enfim… entrar numa universidade pública. Fiquei em 2014, tentei fazer um curso de Inglês com a ajuda da minha avó, que sempre me ajudou bastante e me apoiou… é... e aí eu fiz 6 meses de curso e era muito importante pra mim fazer… é… continuar estudando porque é uma coisa que eu sempre quis, foi estudar e sempre gostei de estudar, então. 

É… fiz esse curso 6 meses e tive que parar devido à situação financeira… o curso não era barato, eu tinha que… também não era na cidade que eu morava e tinha que ir até outra cidade pra fazer, porque onde eu morava não tinha escola de idiomas. E em novembro de 2014 eu voltei pra São Paulo, fiz o Enem, vim pra São Paulo… é… não tive uma nota muito boa de novo, mas consegui uma bolsa de 50% numa universidade privada em engenharia de controle de automação. E na mesma época então eu comecei a trabalhar, foi meu primeiro emprego, numa farmácia. E eu comecei a estudar e a trabalhar. Porém eu só fiquei na universidade 3 meses, porque eu tive que parar, mesmo com a bolsa de 50% eu não conseguia pagar. E como eu falei no começo minha família é muito humilde e não tem ninguém que fez graduação ou algo do tipo e também não tem condições de me ajudar a me manter pagando o curso. Então eu tive que parar o curso com 3 meses. Fiquei muito triste, porque até então… é… eu não tinha pensado em fazer outra coisa que não fosse essa graduação em engenharia nessa área… é… sempre gostei desde criança. Mas tive que parar. Tranquei a graduação, fiquei só trabalhando e aí resolvi fazer um curso técnico. Fiz um curso… na verdade um tecnólogo, que era sanduíche com o técnico, com duração de 3 anos. Fiz o técnico em mecatrônica e não consegui trabalhar na área. Aí eu resolvi… que eu terminei o técnico… eu resolvi trancar o… esse curso, desse continuidade seria o tecnólogo em mecatrônica. E eu resolvi parar porque eu vi que não era o que eu queria. E fiquei mais 6 meses sem estudar, só trabalhan… desempregado também, porque eu saí do meu emprego. E aí quando, em agosto de 2017, eu consegui o emprego de jovem aprendiz e aí eu resolvi fazer um cursinho preparatório pra tentar entrar numa universidade pública que… porque eu sabia que eu teria mais segurança em… em… talvez eu conseguisse, consiga terminar o curso. E aí eu comecei a trabalhar de aprendiz, paguei o cursinho de 3 meses, fiz o Enem de novo em 2017 e me inscrevi aqui na Unifesp… é… com a minha nota. Aumentou um pouco com esse cursinho de 3 meses, mas não aumentou tanto quanto precisava, mas na primeira chamada eu não consegui entrar, na segunda também não e… e eu desisti na segunda chamada… eu já desacreditei que não ia passar. Mas eu tinha um amigo meu de um voluntariado que eu fazia junto com ele e ele também tinha prestado pra um curso aqui na Unifesp e não tinha perdido a esperança. E um dia, ele foi olhar se o nome dele tava lá e o nome dele não tava e o meu estava e ele me avisou e é uma pessoa que eu agradeço muito até hoje porque se não fosse por ele eu talvez não ainda não estivesse na universidade. E eu entrei na Unifesp… é… em 2018, na terceira chamada. E eu ainda trabalhava, porque o contrato de um jovem aprendiz é de 1 ano e 3 meses e eu fiquei o 1º ano da graduação basicamente inteiro até.. até o fim de outubro trabalhando e estudando. Estudava a noite… estudo à noite.  E foi muito difícil porque… é… a minha mãe, ela mora em Santo André, só que em uma região em Santo André muito grande, pra quem conhece e ela mora numa região afastada do centro e de onde fica a estação de trem, que é o transporte que eu tenho que vim pra Osasco. Então… é… ficaria inviável eu estudar à noite e continuar morando lá. Como o salário de aprendiz é baixo, não conseguia também pagar uma moradia aqui em Osasco mesmo conseguindo um auxílio da Prae, que eu consegui. Então, eu conversei com uma tia minha que mora na zona leste, também não tão perto, mas que eu consigo ir e vir até a universi… voltar pra casa pelo menos à noite. Vim não é o problema, mas voltar pra casa é um problema, se eu continuasse morando em Santo André então eu tinha que mudar e eu fui pra essa casa da minha tia que me acolheu… ela mora de aluguel em 3 cômodos, e eu ainda tô lá até hoje porque, infelizmente meu contrato acabou e optei por ficar… eu peguei algumas DPs no 1º ano e eu preferi ficar só com o auxílio da faculdade e tentar eliminar essas DPs que eu peguei no começo… é… nesse ano agora, de 2019. E eu moro com minha tia ainda e meu tio e meus dois primos de 9 e 8 anos. E eu durmo na sala, não tenho privacidade como… é normal pra pessoas que vivem em situações mais vulnerável e todos os dias eu venho pra Osasco, gasto 2 horas pra chegar aqui… é, eu consegui, além do meu auxílio, eu consegui uma bolsa num projeto que tem aqui no meu campus de permanência estudantil, então eu consigo tirar um valor maior, dá pra mim me manter sem eu trabalhar e eu resolvi ficar estudando esse ano e tô só estudando e fazendo parte desse projeto e eu me envolvi mais com a universidade e… mas… é muito, mesmo morando com minha tia continua… eu gasto 2 horas pra chegar até aqui, eu gasto 2 horas pra voltar e chego em casa bem tarde, eu durmo pouco… é… volto pra cá já pra fazer outra matéria durante o dia. Aí eu tô procurando um lugar pra morar aqui em Osasco… é.. mas devido à situação financeira me restringe as opções. E, eu tô isso aqui nesse áudio porque por mais que eu queira desistir e por mais que eu queira parar de estudar… é… eu busco inspiração na minha avó e no meu avô que sempre me aconselharam e fizeram de tudo pra que eu não fosse trabalhar na roça e que eu não fosse plantar, pra ir pra escola, porque eles não tiveram essa oportunidade, infelizmente eles eram obrigado a trabalhar (termina a fala chorando)...