Transcrição do áudio:

 

Meu nome é Carol. Eu tenho 23 anos. Eu estudo aqui na… no campus, na Baixada Santista.

É… bom… a história que eu quero dividir… é… a história de como eu consegui chegar onde eu estou, na universidade. Eu vim de uma cidade pequena, do litoral, chamada Peruíbe e de uma família grande, somos em 5 irmãos. Minha mãe, ela criou a gente uma parte sozinha. O meu pai faleceu quando eu tinha 11 anos e não pensava em universidade. Eu sempre estudei em escola pública. Minha família é de classe média-baixa… minha família é de classe baixa. E… bom… na escola em Curitiba, os professores falavam, assim, sobre… um pouco sobre universidade, mas me parecia uma coisa muito distante e meu pai era quem mais incentivava a gente a estudar. Não necessariamente falando sobre universidade, mas falando sobre a importância do estudo. Minha mãe não se importava com isso, ela estudou até a 4ª série e ela falava que a única que importava pra ela que a gente crescesse e que a gente fosse pessoas boas. Quando a gente se mudou pra Peruíbe assim que meu pai faleceu, eu estudei na escola de um bairro periférico. Estudei na escola Vitalino, estadual. E, eu vi uma diferença muito grande nas duas escolas… a escola do Vitalino, a gente só precisava ir na escola. A gente não precisava fazer é… prova. Eu não lembro de prova, eu não lembro de ter feito prova. Mas assim, não tinha método de avaliação. A professora falava assim que pra alguns alunos, que eles faltavam mais… que se eles continuassem faltando, eles iam reprovar. E isso era o que eu mais ouvia assim sobre… é… sobre assim… ter que ir pra escola e… e... etc. Quando eu tava no segundo ano, eu me mudei pra uma outra escola e… porque na minha sala num dava, não conseguia… a professora não conseguia dar aula e a gente não conseguia estudar. Aí, a minha irmã me deu a ideia de mudar pra uma outra escola… mudei pra essa escola e… na outra escola também não teve muita diferença. Só que eu vi a necessidade de estudar e trabalhar porque eu vi que minha mãe tava precisando de ajuda… né, assim… não necessariamente pras coisas assim dentro de casa, assim… comida… mas pra eu ter algumas coisas pra mim, né, porque como a gente é muitos irmãos né, a gente não tem muito isso de… é… comprar uma coisa só… vou comprar… minha mãe vai comprar uma roupa pra mim e ela vai ter que comprar pros meus cinco irmãos. Então eu comecei a trabalhar. E aí, trabalhando nessa loja, teve um dia que foi… um dia que marcou muito a minha vida. Que foi o dia que a minha gerente pegou e falou assim: olha Carol, vai ser o seguinte, eu vi seu currículo, você não tem experiência nenhuma, você nunca trabalhou e eu tô disposta a te dar essa vaga. Mas assim… você não vai ter horário pra entrar e não vai ter horário pra sair e além disso eu quero que você atenda exatamente dessa forma… a gente vai treinar você, e você vai ter que fazer exatamente da forma que a gente te falar. E eu tava morrendo de vontade de trabalhar e de ter meu dinheiro, então eu aceitei e eu acho que qualquer coisa que me falassem eu ia aceitar. E eu fui trabalhar. Então, até mesmo o jeito de eu me vestir, de eu arrumar meu cabelo, de eu usar maquiagem… que eu nem gosto de usar maquiagem, na verdade. E eu tinha que fazer todas essas coisas pra que ficasse com ar mais agradável a loja, e tudo… assim, pra ela, no ponto de vista dela. E teve um dia que eu me sentia… todos os dias… mas teve um dia que foi o pico que eu me senti muito sufocada. Porque eu comecei a conversar com a cliente, e ela começou a contar sobre a filha dela e tudo mais e eu comecei a falar com ela. E eu não tava nesse momento apresentando nenhuma roupa e a gerente viu isso… que eu tava apenas conversando com ela e que eu não tava apresentando as peças de roupa pra ela comprar. E ela ficou muito brava comigo… ela falou, assim que a gente não tava fazendo do jeito que tava combinado. E eu fiquei pensando: poxa, mas já não estamos fazendo desde o princípio, porque eu não assino a minha folha de ponto e eu não tenho horário pra sair e não tenho horário pra entrar. Então já começou… né… nesse sentido né. Então eu fiquei mais um tempinho lá que eu não queria sair, por causa do dinheiro, mas depois eu saí e fui… fui trabalhar em outras lojas. Algumas coisas e outras mudaram, como… é… teve um horário estabelecido pra eu entrar e pra eu sair e que foi respeitado, mas sempre tinha uma coisa ou outra que… que implicava. Então eu saí e eu decidi estudar. Aí meu irmão… ele… na verdade meu irmão, ele já tinha passado na universidade, na UFPR, a gente tinha ficado muito feliz porque na nossa família isso era impossível(fala com voz embargada).. E quando a gente viu que era possível, que a gente… que a gente ia conseguir mesmo… que ele tinha conseguido… então, assim… uma coisa é a gente ver uma pessoa de perto conseguir as coisas. Então quando eu vi que ele conseguiu, e ele tinha também estudado em escola pública… então… então eu vi a possibilidade de eu conseguir também. Ele entrou em engenharia mecânica na UFPR e eu falei assim: então, vamos ver se agora é minha vez de entrar. E quando eu falei com ele, ele falou assim: Carol, você vai entrar… mas, assim… eu, eu fiz um cursinho popular né, pelo menos. E aí em Peruíbe não tem cursinho público… assim… popular. Então como você vai fazer pra entrar? E eu falei: não, eu vou estudar em casa. E ele falou: não, em casa você não vai conseguir passar, porque… é… pra universidade pública é muito concorrido. E eu falei: não, mas eu vou tentar. Então eu pensei que eu tinha que estudar de uns 2 anos pra entrar pra universidade. Mas aí eu estudei 1 ano, e eu coloquei uma meta de estudar uma quantia de hora por dia. E eu estudei todos os dias e alguns dias claro que eu não consegui porque, enfim, algumas coisas aconteceram. E eu fui fazer o Enem. Mas como já tava com o foco de estudar 2 anos, então pensei assim: estudar esse e o outro ano. Então esse ano eu vou fazer o Enem, mas, tudo bem, se eu não passar, tudo bem. Então eu fiz o Enem bem tranquila e já me inscrevi na Fatec, porque eu fiquei com medo de ter que voltar a trabalhar na loja. Então eu comecei a fazer Gestão Empresarial na Fatec e me inscrevi no Sisu pra Unifesp como primeira opção, e como segunda pra UFPR. E um dia eu cheguei em casa e minha prima me ligou e falou que tinha saído o resultado do Sisu e se eu tinha visto né…  o que que tinha dado. E eu nem tava lembrando mais, porque eu comecei a ter outras coisas pra pensar. E aí quando eu fui ver, eu… eu tinha passado. Eu fiquei, muito, muito, muito feliz mesmo, porque meu irmão não queira me desanimar mas ele não tava acreditando e… e também eu… eu tava acreditando que eu ia passar mas num tava acreditando que eu ia passar naquele momento. Então eu… eu queria deixar o recado do quanto é importante é… essas… as cotas. Porque eu entrei em cota né, de renda e de escola pública e eu tenho certeza que isso me ajudou muito também. Hoje, eu estudo na Unifesp, como eu já falei e também não estou tendo só aula. Eu participo de outros projetos e isso me fez crescer como pessoa, não somente com… com a questão profissional, enfim, acadêmica, mas como pessoa me fez crescer muito e acreditar assim que… que conseguimos… se tiver… é coisas que nos favoreça, que nos ajude a conseguir.